Quem sou eu

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Vou mostrando como sou, e vou sendo como posso. Insta: @danielrprj

12 de abril de 2025

Alma de Água



















Minha alma
escorre mansa
como rio que se esqueceu da pressa.

Canta um pássaro,
e o tempo se deita sobre as pedras,
escutando.

As cachoeiras murmuram segredos
em línguas líquidas,
que só o silêncio compreende.

Chove.
E cada gota cai
como se soubesse exatamente onde pertencer.

O petricor sobe do chão
como incenso da terra,
perfume da memória vegetal do mundo.

Entre pedrinhas e espelhos d’água,
sou leve.
Sou líquida.
Sou quase vento —
mas com raízes.

E na ciranda de folhas no céu,
descubro que a paz
que tem som de riacho
e cheiro de depois da chuva.

Daniel André

8 de abril de 2025

Vale Tudo











Ser honesto no Brasil
é pisar em anzol descalço,
é dar bom dia sorrindo
e ouvir de volta: “seu falso”.

É ver o ladrão engravatado
na capa da revista semanal,
enquanto o pobre é fichado
por roubar pão no sinal.

É voto que some no ar,
é verba que vaza da mesa,
é promessa feita em palanque
com sabor de sobremesa.

A escola com teto rachado,
mas no Senado tem buffet.
O povo jejua esperança,
os ricos brindam com Moët.

Dizem que tudo é “esforço”,
mas o jogo já vem marcado.
Quem nasce longe do berço
vira herói por ter lutado.

Vale a pena? Vale a alma.
Vale a luta com firmeza.
Vale o pouco que se tem
e o muito da nobreza.

Ser honesto virou afronta,
num país de ilusão e eleição.
Mas quem dorme em paz consigo
não precisa de perdão.

Não há cargo, não há grana,
nem medalha de patrão,
que valha mais que a coragem
de quem vive na contramão.

Mesmo cansado,
mesmo calado,
ainda é luta,
e é missão.

Daniel André

12 de fevereiro de 2025

Trilhas do Tempo

Caminhei só, por trilhas do tempo,
entre folhas caídas num outono calado.
Sombra e luz se alternavam no passo,
enquanto a vida, silenciosa, passava.

Nos olhos, brilhos de promessas antigas,
abraços e sorrisos que o tempo levou.
O que não foi — como estrelas distantes —
ainda brilha, sob o véu do que restou.

A juventude é um rio em correnteza,
desce veloz pelas encostas dos dias.
A velhice vem com seu manto tranquilo,
tecendo sabedoria nas dobras da vida.

As flores murcham, as chances também,
mas cada perda ensina o valor do caminho.
E as memórias, como vinho repousado,
guardam o gosto doce do que foi carinho.

Mesmo que o amanhã traga incerteza e dor,
há beleza em lembrar, em sentir, em ter sido.
Porque no fim, a escolha sempre foi o amor —
o que carregamos, mesmo quando tudo é ido.

Daniel André


Uma recordação com essa linda canção, que traz a lembrança da minha infância.

6 de janeiro de 2025

Aquele disco

 


Um belo dia, resolvi mudar
— sussurrou Rita Lee pelas minhas engenharias auditivas —
trocando o “o que será que vão pensar de mim?”
por um glorioso: “foda-se, a vida é minha!”
E vou vivê-la, inteira, sem rodar em loop de censura alheia.

Disseram que gato tem sete vidas.
Pois eu? Já dancei umas quinze.
E vou pra mais,
sem desperdiçar nenhuma em opiniões com cheiro de naftalina.

Preso neste corpo de vinil iluminado,
como faixa esquecida num lado B que te arrebata,
sigo:
planando no som que me arranca do chão
pra dançar com anjos sambistas de calça boca-de-sino.

É suor mergulhado em batidas,
é banho de ousadia sem enxágue,
misturado às vozes bêbadas de alegria genuína.
Todos aqueles artistas loucos —
esses orixás da farra e da dor —
sabiam bem:
pra letra repetida, seja em tristeza ou fantasia,
não há remédio melhor que virar o disco.

Daniel André