Quem sou eu

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Rio de Janeiro, Rio de Janeiro, Brazil
Vou mostrando como sou, e vou sendo como posso. Insta: @danielrprj

1 de dezembro de 2025

Camisas Riscadas



 








No fim do ano, as camisas se tornam páginas,
com traços breves, promessas que o tempo leva.
As assinaturas falam de eternidade,
mas somem depressa, como tudo.

No peito, porém, fica outra marca:
essa não apaga.
É a lembrança calma do último ano,
quando crescemos
entre despedidas simples
e o silêncio discreto
de seguir adiante.

Daniel André

21 de novembro de 2025

O poder das ervas




















No fundo do Brasil
a alma nasce do chão.
Capim vira reza.
Folha vira perdão.
E a gente aprende
que cura tem cheiro.

Alecrim acorda o corpo
manjericão espanta sombra
arruda vigia a porta, e
o saber não sobe 
ele brota de dentro da mata.

Nas varandas de barro
as mãos sabiam antes.
Guiné tilintava na palma
hortelã sopra leveza
e a carne obedecia
ao gesto antigo das folhas.

Nos caminhos de terra
a lembrança se acende.
Folhas que viram conselho
erva-cidreira embala silêncio
erva-doce adoça tristeza,
e o Brasil respira por raízes.

Cada planta
é um pedaço de língua.
Um segredo antigo.
Malva sussurra respostas.
Babosa costura pele partida.
E o corpo entende antes da cabeça.

No fim das contas
o mato sabe mais de nós
do que nós mesmos.
A cura mora ali 
simples, verde, ancestral.
E nós só precisamos ouvir o chão.

— Daniel André

16 de novembro de 2025

O feitiço das folhas

No sebo da tarde chuvosa,
cada livro me chama baixinho,
como abraço oferecendo abrigo.

Folheio páginas que já foram
paisagens na mente de alguém 
segredos guardados no silêncio
de dedos que ali passaram.

O cheiro antigo ascende,
mistura de tempo, poeira e café,
e tudo se harmoniza docemente:
a chuva no vidro,
a xícara morna,
e eu, perdido
nesse feitiço das folhas
que nunca termina
de me ler.

Daniel André

3 de novembro de 2025

Soneto de Finados

 







A chuva caía, lenta, quase em prece,
pingos pequenos sobre o campo frio.
Tantos já se foram, e o tempo tece
silêncios longos no jardim vazio.

Nessa viagem que é a vida, resta
o eco tênue do que foi presença.
Aqui só me resta, e nada mais resta 
lembranças nuas, frágeis como a ausência.

Administro o oceano de saudades,
sem bússola, remando em densas tardes.
A chuva insiste, e o vento a desfaz.

E nessa dor que o tempo disfarçava,
a alma aprende, tarde, que amava.
E chove. E é paz.

Daniel André

30 de outubro de 2025

Quem matou Odete Roitman ?




















Na sala, o povo suspira e devora,
mistério em tela, tensão no ar,
a trama ardente, a dúvida aflora,
Odete tombou, quem vai revelar?
 
corações presos, o tempo parou,
o Brasil inteiro ali se juntou,
entre a cerveja e o sofá da mamãe,
o passado sorri e o presente também.
 
as ruas vazias, o grito contido,
um “eu já sabia!” meio fingido,
e na reprise, o afeto renasce,
entre vilãs, memórias e classe.
 
saudade viva, cena certeira,
de rir, sofrer, na noite inteira,
pois toda alma, entre amor e trama,
quer descobrir: quem matou a dama?
 
Por Daniel André.

 



Tive que ressucitar essa postagem, pois umas duas semanas atrás, vivi uma cena digna de novela! Eu e minha maezinha, tranquilos no banco da praça, saboreando uma pamonha das boas, quando surge um repórter da EPTV me perguntando: “Quem matou Odete Roitman?”

O carioca noveleiro aqui quase engasgou de surpresa! Coincidência ou destino? Justo dias depois de eu postar uma poesia sobre o poder das novelas na nossa cultura, e como elas ditam moda, comportamento e até nossas conversas de praça.

A vida imita a arte... e às vezes, com gosto de pamonha. 

26 de outubro de 2025

O Louco

 

No sinal, vejo um homem na esquina,
torcendo-se diante do invisível.
Dizem louco
e ele encara o nada
como quem reencontra um velho amigo.

Anjos ou demônios
não sei.
Talvez veja Deus
com as mãos sujas de barro,
ou apenas o reflexo do que perdi:
o mundo antes de ser mundo,
ou depois que tudo nem vivi.

O farol muda,
eu sigo.
A dúvida dirige comigo,
e eu fujo
com medo de entender.


Por Daniel André

2 de outubro de 2025

Orações

 













No fechar dos olhos,
um sopro é prece,
a dor se dissolve.

Entre mãos erguidas,
não há fronteiras,
apenas desejo de luz.

Toda palavra sincera
é rio escondido
que encontra o mar.

Corações nus
rezam sem nome,
mas tocam o infinito.

Na chama da fé,
não importa qual,
o fogo aquece igual.

E a cura floresce,
leve, invisível,
como vento em paz.

 

Por Daniel Andre


27 de setembro de 2025

Sábado no Salão

 












No sábado o salão ganha alegria,
um coro de risadas se levanta,
secadores sopram como sinfonia,
cada mulher se enfeita e se encanta.

Minha mãe se ilumina em harmonia,
na cor que aos poucos brilha e se adianta,
e o tempo, que parecia correria,
se faz suave, doce e até se espanta.

Um cortejo de mulheres, cada uma,
descobre no espelho a própria luz,
a beleza que em riso se perfuma.

E eu, calado à parte, vejo o que seduz:
é como ver dançar a clara espuma
do mar que em ondas a vida conduz.


Por Daniel André

21 de setembro de 2025

Círculo de Névoas

 

No berço do tempo o fim se faz começo,
a infância dá à velhice a sua mão.
O riso do menino é tênue ingresso,
o velho ri sem ter mais explicação.

Ambos pedem colo, iguais no tropeço,
nas névoas do escuro buscam proteção.
Envelhecer é desenhar no ar o traço
que a infância rabiscou no coração.

O sopro do Alzheimer apaga o nome,
como vela apagada em aniversário,
e no velório igual, a luz consome.

Mas resta uma centelha em breve relicário:
nascer e morrer se tocam — doce fome,
círculo eterno, destino necessário.

 

Por Daniel André

16 de setembro de 2025

Gemada de Mãe

 














Homem de ferro,
ombros largos,
coração pesado.

Ergue o mundo,
mas tropeça no silêncio
do quarto vazio.

Às vezes precisa
não de guerra,
mas de colo.

E de uma gemada quente,
doce como infância,
no copo da mãe.


- Daniel André

11 de setembro de 2025

O Falso Patriota

 













Clama em praça: “Eu amo o Brasil!”, mas mente,
beija a bandeira só pra posar na corrente.
Sonha com o dólar, despreza o real,
De joelhos aos gringos num culto servil e banal.

Aplaude tarifas que esmagam o povão,
Chama autoritarismo de “força da nação”.
Finge respeito à nossa soberania,
Mas vende o futuro com falsa valentia.

Brada contra ditaduras só quando convém,
Se for americana, aí já lhe parece um bem.
Defende bombardeios em nome da “liberdade”,
Trocando justiça por crua desigualdade.

Prega patriotismo em tom moralista,
Mas age qual sócio do capital imperialista.
Herói de papel, farsante colonial,
Patriota de araque, vassalo imoral.


por Daniel André


7 de setembro de 2025

Sexo dos deuses

 












Na festa do cosmo, eles dançavam.
Deuses de todos os nomes, riam.
Ganesha beijou Maria na testa.
O vinho era luz.
O mistério: quem criou tudo?

Afrodite suspirou por Jesus.
E ele, tímido, corou.
Buda acenou para Oxóssi.
Os dois sorriram, em silêncio.
A música era eterna.

Yemanjá dançava com Poseidon.
Águas se abraçavam no chão.
Xangô brindou com Thor.
O trovão respondeu em eco.
O mar batia palmas.

Ísis trocou perfumes com Krishna.
O amor tinha mil braços.
Odin piscou para Oxum.
Rá brilhava nas janelas.
A noite era dia.

Maria riu de Dionísio.
Ele servia uvas, beijos, delírios.
Ganesha tocava tambor.
Eros atirava setas.
Até Hades esqueceu da morte.

No fim, silêncio.
Todos olharam o céu.
Quem criou o mundo?
Ninguém respondeu.
Todos se beijaram de novo.

 

Daniel André


2 de setembro de 2025

Desfile dos Ipês


 













as ruas estalam
um rastro de sol
despenca das copas

flores marcham
sem pernas
sem farda
só o vento como tambor

os postes piscam
como generais bêbados
aplaudindo o amarelo

pétalas pousam
na testa dos carros
transformando buzinas em pássaros

a cidade inteira
engole ouro em pó
e acorda sonhando que é árvore

 

— Daniel André


31 de agosto de 2025

Evolução

 











No ventre da terra germina a semente,
um suspiro verde rompe a escuridão.
Ali começa o ciclo paciente,
um fio de vida, pura expansão.

O inseto dança no pólen dourado,
o voo frágil que move destinos.
Cada batida, um elo traçado,
no tear secreto dos caminhos divinos.

A fera que ruge na noite silente,
sangue que pulsa, instinto que guia.
Na luta bruta, no caos inclemente,
há um sopro oculto de sabedoria.

O homem ereto, olhando o infinito,
cria perguntas, ergue o pensar.
Na chama inquieta do seu espírito,
o fogo é mais do que só queimar.

Das ondas marinhas ao canto da ave,
tudo é centelha da mesma canção.
Rios e astros, em marcha suave,
tecem o pulso da evolução.

E no universo, que nunca descansa,
explode a energia em flor estelar.
Tudo que vive, sonha e avança,
é o cosmos tentando se lembrar

— Daniel André

22 de agosto de 2025

A última banca de jornal










 







Foram-se os discos,
as agulhas girando,
o chiado da memória,
silêncio nas prateleiras.
 
Foram-se as máquinas,
os dedos batendo,
o som de ferro e tinta,
um eco sem retorno.
 
Foram-se as cartas,
o perfume no papel,
as esperas longas,
a caligrafia lenta.
 
Na esquina, a livraria,
E a última banca de jornal, cansada
guardando o fim,
os últimos olhos de papel.

— Daniel André

16 de agosto de 2025

Tentamos










 






Amar não é receita,
é corpo em busca de abrigo,
às vezes espelho de carências,
às vezes abismo de diferenças.
Cada encontro é uma resposta
quem nem sabemos a pergunta.

Há quem precise de silêncio,
há quem clame por gestos ruidosos;
um oferece constância,
outro, vertigem.
E no meio da troca,
o tempo decide a duração do laço.

As necessidades nem sempre coincidem:
um pede ternura lenta,
outro, fogo imediato.
E ambos têm razão,
pois o coração não entende de regras,
apenas de pulsares distintos.

Quando se encaixam,
é milagre breve,
um intervalo de eternidade.
Não dura porque deve,
dura porque pode
e isso já é bastante.

Amar não se cobra,
nem se mede em esforço ou dívida.
Ele é gratuito,
se oferece nu,
ou se retira em silêncio,
quando perde sentido.

E ao fim da história,
sem vencedores nem culpados,
apenas dois seres
que se encontraram no tempo certo.
Nada faltou, nada sobrou:
tentamos.

— Daniel André

8 de agosto de 2025

Lua Cheia em Aquário.

 


Lua cheia em Aquário,
vento frio, olhar desperto.
portas de luz se abrem,
o tempo respira lento.
 
Rosas brancas na água,
silêncio que acaricia a pele.
camomila dissolve o peso,
o coração se recolhe.
 
Flor de laranjeira no ar,
memórias se tornam suaves.
cura é um sopro invisível,
o corpo bebe calma.
 
08:08, linha de ouro.
o céu escreve segredos.
somos rio e estrela,
inteiros outra vez.

 Daniel André

2 de agosto de 2025

Sobrevivente

 


















Sonhei alto.
Esqueci que a gravidade é filha da realidade.

Amanheceu na cidade grande.
Não ouço galos cantando.
Ouço sirenes miando
o choro mecânico da selva cinza.

Às quatro da manhã
são as buzinas que gritam.
Quem grita dorme?
Quem dorme, perde.
Perde o ponto, o tempo, o troco.

O malandro não dorme até tarde.
Ele vigia o caos,
vende sorte em papel amassado.
É o bicheiro da esquina,
com olhos de quem viu mais fim do que começo.

Troquei o cheiro de terra molhada
pelo perfume ácido do metrô lotado.
Lá, o silêncio era ouro.
Aqui, barulho é moeda de troca.

Na cidade grande,
ninguém tem tempo de se perder.
Então nos perdemos todos juntos,
no mesmo horário de pico.

Fui buscar futuro.
Ganhei um aluguel atrasado.
E um vizinho que canta sertanejo às três da manhã.

Sobrevivo.
Porque viver,
aparentemente, custa mais caro que sonhar.

Daniel André

30 de julho de 2025

Remédio para a alma
















Pra acalmar a alma,
bastava uma casa pequena,
grama de lençol,
um pé de manga com balanço
que empurra a gente pro céu,
como se o vento tivesse mãos.

Na estante, o Santo Expedito vigia,
as espadas de São Jorge guardam silêncio.
Jesus abençoa os avós
na foto que sorri mais que a parede.

A vitrola chia Clara Nunes,
e o ruído vira carinho.
O chão, vermelho e gasto,
acolhe meu cansaço.

Basta um café com água no filtro de barro,
feito devagar,
e o cão na porta de casa
vendo o infinito piscar.

A paz não grita.
Ela sussurra,
num lar simples
de alma lavada.

Era isso. Sempre foi.

— Daniel André


16 de julho de 2025

Tato

 

Pra te sentir,
preciso te tocar.

A pele entende,
antes do cérebro.

Mas também desejo,
que me toque o olhar.

Palavras têm dedos,
mesmo sem mãos.

Silêncios falam,
se vêm com intenção.

Toca-me inteiro,
com tudo que és.

Me toca sem pressa,
mas com urgência.

Porque amor,
não se vê, se sente.

E eu,
quero sentir tudo.


Daniel André

11 de julho de 2025

Silêncios de Inverno

 

É no inverno que me dispo das urgências
e visto silêncios como quem veste lã.
As palavras encolhem, tímidas,
nos cantos da boca que prefere o chá.

O mundo desacelera sua pressa ordinária,
e cada sopro de vento parece um sussurro antigo
como se a Terra contasse segredos
só aos que ousam escutar com os ossos.

As árvores, essas esculturas de paciência,
esticam seus galhos como antenas
buscando sinais de alguma verdade solar,
enquanto os homens …
seguem ignorando o próprio eco.

Entre cobertores e olhares demorados,
descubro que o calor mais raro
não vem da lareira acesa,
mas da alma que arde em meio ao deserto gelado da multidão.

E quando caminho por ruas desertas,
escuto meus próprios passos me seguindo,
como se meu outro eu, aquele mais inteiro
só se atrevesse a existir no inverno.

Daniel André

8 de junho de 2025

Véu de Noiva

 

Vesti o espelho do silêncio das minhas,
minha mãe em suspiro, minha avó em costura.
Cada renda, um segredo que caminha
no ventre do tempo, em alma pura.

O véu caiu como bênção e promessa,
coroa de vento, rito de flor.
Ali, fui semente e fui colheita,
no altar dos dias, desabrochei em cor.

Minhas mãos tremiam feito as delas,
no fio da espera, no nó do sim.
E ao andar, senti que todas me seguiam 
mulheres em mim, vestidas de mim.

Não fui noiva, fui constelação contida,
uma lua inteira em gesto breve.
Pela primeira vez, fui minha vida,
tão de volta e num véu tão leve … 

— Daniel André

21 de maio de 2025

Ainda Somos Bons

 











Perdemos o caminho cedo,
num mapa rabiscado por mãos
que não eram nossas.
Nascemos com a bússola girando feito louca,
e um coração grande demais
pra caber nesse mundo que exige medidas exatas.
Vivemos tropeçando no peito.
Ele pesa. Ele pulsa fora do compasso.
Nosso passo é hesitante,
feito dança ensaiada sem música.
Queremos acertar,
mas pisamos torto
e às vezes esmagamos flores
achando que eram pedras.
 
Guardamos culpas em bolsos fundos.
Algumas são fósseis.
Outras, presentes de família.
Carregamos tudo como herança
não reclamada, e sofremos séculos em silêncio
aquele tipo de dor que se disfarça de “tá tudo bem”.
Somos confusos.
Exageradamente humanos.
Com excesso de sentir
e pouco talento pra traduzir.
Amamos errado,
choramos calados,
e sorrimos com a alma em curativo,
só pra ninguém notar que a esperança
anda costurada com linha fina e um fiapo de fé.
 
Mas veja, além da bagunça,
do caos, da desculpa engasgada.
Há um coração aqui. Inteiro no seu erro.
Fiel na sua falha. Ainda batendo por todos,
mesmo quando o mundo diz não.
Mesmo quando nós dizemos sim
e o resto se parte.
Sim, ainda batemos.
Mesmo feridos, ainda amamos.
Mesmo errando, ainda somos bons.

— Daniel André 

17 de maio de 2025

Lótus

 

No lodo escuro, onde o pântano é rei,
Desponta a lótus, pura, imaculada,
Sua beleza em meio à lama é lei,
Flor que resiste à dor enraizada.

Assim também a alma iluminada
Se ergue firme em trevas de maré,
Não se corrompe, mesmo encharcada,
Pois guarda a luz onde a esperança é fé.

Que importa o fel, a dor, a noite fria,
Se há no peito um sol que não se apaga?
O coração, em paz, floresce o dia.

Tal como a flor que a podridão não traga,
Quem ama a vida em sua poesia
Transcende o caos e nunca se propaga.


— Daniel André

11 de maio de 2025

Mães de Todas as Espécies

 

I
A leoa não pensa.
Ela protege.
A coruja não duvida.
Ela vigia.
A elefanta lembra.
Sempre. Até das dores.
A loba não pede licença.
Ela defende com dentes.


II
A gata finge desdém.
Mas morre por dentro se o filhote mia longe.
A baleia canta
canções que ninguém entende
só o filho.
A égua espera.
Mesmo no galope.
O instinto é feroz,
mas tem cheiro de leite.


III
Ser mãe é morrer em paz
cada dia, só pra ver o filho viver inteiro.
Não é só humano.
É selvagem.
É universal.
É sagrado sem religião.
Mãe não é papel.
É pulsação.


IV
Ela sente o perigo
antes que ele aconteça.
Ela ama antes de ver.
E continua amando,
mesmo sem entender.
Mãe é o começo
que nunca termina.
A todas elas, de todas as espécies:
Vocês são o elo.
O milagre com garras.
A ternura com dentes.


— Daniel André

7 de maio de 2025

Amor em Grãos












No fogão, ele canta, amarelo e fiel,
O cuscuz se levanta, mais quente que o céu.
Não tem luxo, nem ouro, nem prato de rei,
Mas tem gosto de afeto, do jeito que amei.

Com manteiga escorrendo, um café do lado,
É banquete de rei, num trono improvisado.
Quem precisa de vinho, de queijo importado,
Se o amor tá na massa, no milho ralado?

Cada grão um poema, uma rima que brilha,
Mais sincero que janta em família.
É amor que não grita, que não cobra flor,
Mas que aquece a barriga — e também o amor.

Então brinde ao cuscuz, rei da calmaria,
que ensina que amor é calor e farinha.
Se for pra sentir, que não seja com medo,
mas com cuscuz quentinho... e um cafuné cedo.

— Daniel André

3 de maio de 2025

P.S.: Te Vi Fazendo Café

 

Amor,

era só a sua blusa,
mas no teu corpo,
virou domingo.

Fiquei na cama te olhando,
com a vitrola tocando nossa velha canção,
e o cheiro do café
te anunciando melhor que qualquer sol.

Nem sei se foi o jeito
de existir tão sem esforço,
ou só o teu cabelo bagunçado —
mas me apaixonei de novo.
Acontece sempre.

Volta com duas xícaras?
(Eu tô ficando pra sempre, se der.)

 Teu.


— Daniel André.

1 de maio de 2025

O Trabalhador Invisível

 

Quem levanta cedo e sua
Sem ter nome no jornal
É quem move esse Brasil
Com esforço colossal.
Mas a elite do atraso
Só enxerga o capital.

O gari limpa a cidade,
Tão herói quanto soldado,
Mas recebe em troca o quê?
Um salário rebaixado.
Enquanto o luxo desdenha,
Ele é sempre ignorado.

No shopping, tem trabalhador
Preso em dia promocional,
Nem domingo tem sossego,
Nem direito ao natal.
O descanso é só promessa
Num contrato desigual.

Garçom serve mesa rica
Com sorriso no olhar,
Mas por dentro vai calado
Com vontade de gritar.
Pois nem sempre o bom serviço
Faz alguém melhorar.

E a escala 6 por 1
Já virou prisão moderna.
“Um dia de descanso!”
Mas só na ponta da perna.
É promessa que se quebra
Quando o patrão já governa.

E lá no fundo da história
Ecoa a voz de um rapaz:
Chamado Karl Marx na lida,
Lutando por algo eficaz:
Que o trabalhador tenha
Liberdade, pão e paz.

Pois é quem trabalha duro
Que mantém a roda viva.
Não é banqueiro em gravata,
Nem promessa ilusiva.
É suor que move o mundo,
É a base mais ativa!


—  Daniel André