Ainda é madrugada.
Dois corpos de ébano —
robustos, inteiros —
caminham ao sabor do vento.
Pés que sambam no asfalto quente,
em ritual com as sombras
e a lua cheia... ardente.
Viajantes do tempo suspenso,
onde o real toca o sonho,
e o sonho se torna concreto,
como as fugidias lembranças
que ainda sussurram no peito.
Seus olhos:
mapa de uma África não esquecida,
cheios de histórias,
de uma diáspora que ainda pulsa.
— Herdeiros de deuses,
e de rainhas caladas no tempo.
E de madrugada,
dois homens negros
se recusam a ser apenas poesia escrita.
Eles andam.
Eles são.
Na rua —
uma revolução sem grito,
apenas o som da ousadia
em silêncio.
(A fumaça sobe...)