Rostos despertos, outros ainda dormindo.
É o rito diário dos filósofos de ônibus.
Trabalhadores em seus próprios mundos,
pensando, em silêncio,
sobre a brevidade que é viver.
Na bolsa, a marmita — sustento do corpo.
Na mente, os sonhos — sustento da alma.
Cada um, em sua rota particular,
olha pela mesma janela,
ouve o mesmo ronco do motor
e leva no peito questões universais.
Da janela,
brotam perguntas sem resposta.
Olhares perdidos, apaixonados,
outros tensos, ansiosos,
mas todos, de alguma forma,
em busca de algo maior:
uma saída para dentro.
O dia termina.
E outro começa.
Entre um ponto e outro,
a chance rara de pensar —
de perceber que mudar
nem sempre é descer em outro bairro.
A mudança mais profunda
não troca de endereço.
Ela acontece aqui,
no banco onde a gente
finalmente se escuta.