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Rio de Janeiro, Rio de Janeiro, Brazil
Vou mostrando como sou, e vou sendo como posso. Insta: @danielrprj

15 de março de 2013

Cotidiano a Dois











Acordo.
A cama ainda tem você, ou o rastro de você.
No porta-retrato, o tempo parece calmo,
mas há algo que se move dentro da quietude.

A mensagem chega: te amo todos os dias.
Sorrio como quem esqueceu por um instante
que o amor também cansa,
e mesmo assim insiste.

O almoço, o gesto, a pressa 
tudo tem um brilho pequeno, cotidiano.
De longe, você acena,
e o mundo parece entender.

À noite, macarronada,
um toque, um olhar que repousa.
Penso: o amor é isso 
o eterno disfarçado de agora.


Daniel André - 15Março2013

Sobre Chegadas e Partidas













Celebro as chegadas
como quem abre a janela ao verão 
há luz, há riso, há promessa.
Mas as partidas…
essas vêm lentas, graves,
como um adeus que o corpo recusa a dizer.

Somos feitos de encontros,
mas o vazio também nos molda.
Cada rosto que passa
é um espelho breve:
mostra o que somos,
ou o que tememos ser.

Há quem catalogue o diverso,
por medo daquilo que não cabe.
Ignoram que a diferença é o sal da existência,
e que o igual cansa,
como o silêncio sem alma.

O tempo ensinou-me
que o desapego é uma forma de fé.
Nem tudo se renova.
Há vínculos que não ligam 
apenas prendem.
E às vezes, romper
é a única maneira
de permanecer inteiro.


Daniel André - 15Março2013

14 de março de 2013

Poema em ti








Sou talvez o exagero da ternura,
a poesia que se reencarna em gesto.
Trago comigo o homem simples,
mas que por ti
carregaria o mundo 
sem alarde, sem queixas.

Sou luz entrando na pele do teu cansaço,
um rumor de flores e silêncios.
No teu corpo me torno horizonte,
me desfaço em poente,
sem pressa de voltar.

Te amo como quem vela,
te guardo como cão e abrigo.
No meio do caos, és refúgio,
és o céu que ainda acredita em mim.

Sou excesso, sim 
como o mar que não sabe conter-se.
Profundo de ternura,
selvagem de desejo.
E em ti me perco,
como quem, enfim, se encontra.


Daniel André - 14Março2013

Efeitos Colaterais


Tenho dor de cabeça
e um resto de ti nos olhos.
Enquanto falas demais,
eu só queria um gole d’água
e silêncio.

O amor virou comprimido 
tomo dois por dia
pra não gritar.
Quem é manso
não sabe pedir socorro.

Teu carinho me arranha a língua,
tem gosto de ontem e dúvida.
Posse?
Não sei.
Carrego pedras no bolso,
mas continuo andando.

Ainda há uma luz,
longínqua, trêmula 
mas há.
O coração, mesmo torto,
insiste:
bate, sangra, acredita.


Daniel André 14Março2013

13 de março de 2013

Amor platônico



Broto 
toda vez que te vejo.
Não sei se é flor, ou medo.

O tempo corre.
Eu fico, imóvel,
preso ao instante que me inventa.

Viro palavra,
não por querer ser verso,
mas porque o silêncio não basta.

Meu peito acende.
A razão evapora.
Sinto tua presença sem toque,
como quem reconhece o vento
e se deixa ser levado.

Há ciúme, sim 
um relâmpago pequeno, íntimo.
Mas o amor continua.
Te amo apesar,
ou por causa.

Guardo-te no que sou:
meu segredo,
meu altar,
meu impossível.


Daniel André  -  13Março2013

9 de março de 2013

A semente teimosa

                                                                                                                                    

Plantei esperança
num chão cansado de promessas.
A terra respondeu primeiro 
com silêncio e um broto tímido.

A chuva veio justa,
o sol, corajoso.
A árvore nasceu discreta,
mas com vocação de abrigo.

Não foi milagre:
Foi insistência da terra.
Foi política de formiga,
espiritualidade de adubo.

A paz, descobri,
se planta e se rega com teimosia.


Daniel André - 09Março2013

6 de março de 2013

Setenta e tanto

Acho que vivi nos anos 70.
Ou talvez eles me vivam até hoje.

O som das calças soava como um sino
e eu me movia, livre,
entre cores que pareciam acreditar em mim.

Não era rebeldia.
Era um modo de existir sem pedir desculpa.

O mundo pesava 
havia censura, medo, mas também uma febre boa
de ser inteiro mesmo com rachaduras.

Hoje tudo corre rápido demais.
Até a liberdade vem plastificada.

Mas às vezes, quando o vinil arranha
e o chiado respira como um velho mantra,
sinto que continuo lá 
num tempo que ainda dança dentro de mim.


Daniel André - 06Março2013

2 de março de 2013

Amor em estado de guerra














Na sala 
abraços famintos explodem no sofá,
palavras são facas,
mordem o ar.
Libido: granada acesa.
Respiramos pólvora e saliva.

No quarto,
a chuva nos espiona 
cada gota é testemunha,
cada trovão, uma confissão.
A lua, cínica, finge pudor,
mas anota tudo no diário da noite.

No box,
o vapor é revolução.
Arranhões, grafites da carne.
O espelho grita sem boca.
A água nos batiza com lascívia,
e o sol nasce, ofegante,
entre colinas incendiadas.

Na cozinha,
o amor ferve junto ao café.
Bebemos desejo em goles longos,
enquanto o dia, covarde,
recusa o fim.

Amar-te é sublevar-me 
um corpo contra o tédio,
um beijo contra o mundo.


Daniel André  -   02Março2013