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Vou mostrando como sou, e vou sendo como posso. Insta: @danielrprj

16 de dezembro de 2015

Soldado Ferido


Tiros e pedradas de ingratidão
vão abrindo rachaduras
na minha égide de gentileza —
fendas crescem
onde antes havia flor.

No campo de batalha,
as botas de couro ecoam,
cordões umbilicais se enforcam,
e a ternura...
não tem trincheira.

Não é todo inimigo que acerta.
Alguns tombam diante
do meu coração hospitaleiro,
ainda disposto,
mesmo cansado.

De guerras sem sentido,
já estou farto.
Eclodo a luz da razão,
desarmo a hostilidade aparente,
mesmo que o peito esteja encharcado
de lágrimas que ninguém vê.

Com o coração costurado
feito pano antigo,
caminho com a cabeça erguida,
punhos de fogo,
alma de ferro.

Sou soldado ferido.
Mas não vencido.


Daniel André.

9 de dezembro de 2015

Cenas de Uma Cidade em Silêncio


Um homem fuma o tempo no cigarro,
o outro sorve a noite em sua bebida.
Ambos, sozinhos, perdidos no escarro
de um mundo que não explica a vida.

Uma mulher flutua pela rua,
entre cortinas frias da madrugada.
Pensa. Chora. Sente-se nua,
por jamais ter sido amada.

Um jovem, esquecido pelo mundo,
anda ferido em seu devaneio.
Ninguém o vê — e num silêncio profundo,
caminha em sonho, medo e receio.

Doses pequenas de compaixão e humildade
seriam cura — leve, mas certeira —
pra essa solidão disfarçada de cidade
que nos veste a alma inteira.


Daniel André.

28 de novembro de 2015

Zangões em Flor



Dois bravos, sem colmeia,
sem ferrão, sem direção,
expulsos do ninho,
unem asas e vivem
presas no voo da paixão.

Diante da flor mais bela,
criam seu próprio jardim.
Extasiados — jamais zangados —
porque o amor,
quando é puro,
nunca foi ruim.

Nas brisas das montanhas,
no perfume que dança nas flores,
fazem seu voo nupcial:
dois zangões livres,
polinizando amores.


Daniel André





Milton Nascimento - Paula e Bebeto (Qualquer maneira de amor vale a pena). Abraços meus amigos, fiquem na paz.

24 de novembro de 2015

A Igrejinha


Grejinha toda linda,
envolta no verde silvestre,
bordada pelo canto do uirapuru
e guardiã dos desenhos rupestres.

Por séculos, no pulmão da mata,
respira o tempo em paz sagrada.
Carrega no ar o perfume da história,
e a fé de um povo que nunca se apaga.

Ali, a igrejinha alimenta esperanças,
com batismos à beira do rio,
e romarias que florescem danças
em nomes de santos...
e de amores tardios.

O sino, quando toca, não chama só fiéis —
chama o vento, chama a folha, chama a reza.
É um templo pequeno, mas é céu por dentro,
morada do sagrado
em toda sua leveza.


Daniel André





E para acompanhar o cenário poético de "Igrejinha", Jesus, alegria dos homens de J.S.Bach. 

4 de novembro de 2015

Além do Corpo


Não é o teu corpo
— onde minha língua bífida desliza —
orvalho salgado na pele em brasa,
mãos famintas de libido,
urros cravados no lençol do instante,
que fazem de mim o teu prisioneiro.

Não.

O que me prende a ti
está além do suor,
além da amizade,
além da intimidade dos dias,
dos anos,
da vida.

É algo sem forma,
sem nome,
sem medida.

É invisível…
mas, meu Deus,
como é bom.


Daniel André




30 de outubro de 2015

Retirada

É necessário sair de cena.
Apagar, com calma,
as luzes da ribalta.
Se sentirem minha falta,
procurem-me
na dor pulsante da saudade.

É necessário virar átomo.
Sumir.
Ser invisível aos olhos rasos.
Esconder-se nas entrelinhas,
nas pausas,
no silêncio que ninguém lê.

É necessário morrer.
Ao menos um pouco.
Sentir-se coberto por cravos,
abraçado por ausência,
até que o corpo aprenda
a linguagem do nada.

E quando, enfim, renascer —
que meu desalento tenha evaporado,
como o orvalho de um adeus
esquecido ao sol da manhã.


Daniel André 

17 de agosto de 2015

É Doce, Meu Amor


É doce...
tudo em nós, quando a noite respira.
Nossos passeios sob a lua cheia,
com estrelas miúdas salpicando o céu
como se o universo nos aplaudisse em silêncio.

E lá estamos — nós dois —
na roda gigante do amor sereno,
girando devagar ao som
das batidas mansas dos nossos corações,
como notas suaves
de uma canção que só a gente sabe cantar.

É doce...
cada encontro bordado em ternura,
mãos entrelaçadas como promessas,
olhos sorrindo sem dizer palavra,
num romance que dança
ao som da luz que sai das nossas almas.

Amar-te é como flutuar
num verso sem rima,
onde até o silêncio se derrete
de tanto sentir.

É doce...
tudo que somos,
mesmo quando não dizemos nada.
Porque o amor — o nosso —
é feito de açúcar, silêncio,
e poesia embriagada.


Daniel André.

14 de agosto de 2015

Minha Alma Quer Pedalar


Minha alma, sedenta por trilhas novas,
quer pedalar sem pressa, sem rota certa.
E vai...
Rumo àquela árvore torta e serena,
perdida nas pestanas das montanhas,
onde o vento escreve curvas no ar
e as gaivotas se embriagam
no brilho do sol que pisca despedidas.

Sinto a seda do vento, perfumado,
trazendo no sopro
flores pequenas, joaninhas vermelhas,
beijos leves que tocam
meu rosto sorridente.

O verde — vivo, vasto, vibrante —
me saúda com braços de folhas,
com abraços de vereda,
com ternura de mata que acolhe.

Minha alma sobe na árvore frutuosa,
brinca entre galhos como criança antiga,
escorrega no musgo risonho,
deita na relva fresca,
e sacia a fome de paixão
com frutinhas vermelhas
que lembram amor maduro
e esperança que ainda brota.


Daniel André

13 de agosto de 2015

Romantismo na Serra


Cortina de névoa na manhã,
chuva fina beijando a terra.
Árvores orvalhadas no campo,
um silêncio doce...
o romantismo da serra.

Aroma de café recém-passado
permeia o inverno sereno.
Abraços longos,
soprados de leve
pela brisa —
a galerna do ameno.

O céu se tinge de rosa antigo,
a lenha estala na lareira,
e na varanda tímida,
florescem cerejeiras.

Cisnes deslizam, enamorados,
passarinhos cantam devagar...
e o frio — ah, o frio! —
chega só pra nos encantar.


Daniel André